segunda-feira, 10 de junho de 2013

... acho que não, depois de um certo tempo a gente atrapalha...

Uma frase assim, sem inicio e sem fim, solta no ar, talvez, não tenha nenhuma significância, fica até sem nexo, mas e se for dita por uma pessoa nascida em 1925, que traga muito no seu contexto emocional, acaba por desarmar a tua alma e te deixa sem argumentos para responder.

Então, vamos do inicio.
            
Dia destes, atendi no meu trabalho uma senhora extremamente simpática, magra, mas voz firme e de conversa agradável e fluente. Uma típica vozinha destas de filme, sabem?
            
Quando vi a sua data de nascimento, parabenizei-a, dizendo aquelas coisas tipo “que bom, a senhora com essa idade, isso é uma dadiva nos dias de hoje, viveu e tem muita historia para contar”, ao que ela, sempre com uma ponta de sorriso nos lábios respondeu:
            
- Claro que é bom meu filho, mas sabe, por maior que seja a família da gente, com irmãos, filhos e netos, depois que morre o companheiro da gente, a gente fica muito só. Ninguém tem tempo para parar e tirar um dedo de prosa com a gente, sentar e tomar um chá então, nem pensar. Dos irmãos, quem não esta doente, esta preso as suas próprias angustias, tal qual a gente, os filhos sempre correndo, não dispõe de tempo pra gente, os netos tem a tv ou a internet, que é mais atraente do que ouvir nossas conversas então, “acho que não é bom viver muito, depois de um certo tempo, a gente só atrapalha”.
            
Esse pequeno comentário, de uma conversa quase informal, de pouco mais de dois minutos, não me permitiu engolir aquilo em seco, pois me deu aquele nó na garganta, daqueles que se estende para o peito e gera uma sensação de tristeza tão grande, refletindo no disfarce dos olhos marejados tanto que me veio à cabeça que, talvez, a maior epidemia da humanidade nos dias atuais, que angustia e mata, seja justamente a solidão. Mais especificamente aquela que exclui as pessoas do seio familiar, do ente querido que não te nota, não fala e muito menos responde a uma simples saudação.
            
Vejam no caso dessa senhorinha e de tantas outras por aí. Quantas noites sem dormir? Quantos ninar o bebe até as costas ficarem dormentes? Quantos levantar a noite e cobrir os filhos? Quantas manhãs e tardes, talvez, dias, semanas ou meses atendendo os netos? Quantas papinhas e mamadeiras? E colos. Quantos colinhos quentinhos? Sem falar das bolachinhas e dos doces da vovó que até curavam a dor de uma peraltice.
            
Alguém já disse que podemos estar rodeados de mil pessoas e, ainda assim, sentirmos solidão, mas a que mais dói e derruba qualquer pessoa é justamente a exclusão e o descaso dos que amamos.
            
Quem não tem tempo para dar atenção aos seus agora, não poderá exigir atenção dos seus amanhã, pois o espelho do tempo refletira exatamente aquilo que você foi ontem.

Autor: Guilherme Quadros
Email: gqkonig@hotmail.com

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