quarta-feira, 30 de julho de 2025

"Brasil fora do Mapa da Fome. Só esqueceram de avisar o povo que ainda tem fome."





Saiu nos jornais com pompa e circunstância: “Brasil está novamente fora do Mapa da Fome da FAO”. Um feito digno de manchete, palmas e discursos inflamados em palanques internacionais. Mas basta sair à rua — de Norte a Sul, do campo às favelas — para entender que o tal “mapa” parece mais ficção diplomática do que reflexo da realidade brasileira.

Enquanto o governo celebra com relatórios e estatísticas bem calibradas, o povo encara fila em restaurante popular, cesta básica parcelada e restos de açougue como refeição. O Brasil pode até ter saído do mapa da fome da ONU, mas a fome ainda está no mapa da rotina de milhões de brasileiros.

A pergunta que não cala é: até quando viveremos de mentiras com selo oficial?
Até quando vamos aceitar que relatórios com base em médias distorçam o que está diante dos nossos olhos? Sim, há avanços pontuais. Mas dizer que o Brasil venceu a fome porque a média nacional caiu é como afirmar que todos nadam bem porque a piscina tem, em média, um metro de profundidade — mesmo quando alguém está se afogando na parte funda.

A propaganda é eficiente: enche o peito dos políticos, vira post nas redes sociais e vira vitrine internacional. Mas nas panelas... ecoa o vazio. O gás continua caro, o arroz voltou a ser item de luxo, e o café da manhã se resume, cada vez mais, a um gole de esperança — amarga e morna.

Pior: há quem acredite. Porque repetir a mentira com convicção é uma técnica antiga. E o brasileiro, generoso por natureza, quer confiar, quer acreditar. Mas chega uma hora em que o estômago fala mais alto que o slogan.

O Brasil pode ter saído do mapa da fome da FAO.
Mas enquanto milhões ainda dividem um pão dormido, a fome segue bem geolocalizada — e com endereço fixo na periferia.

terça-feira, 29 de julho de 2025

Brasil: Políticas Públicas para criar uma Nação de Miseráveis

Durante décadas, os governos brasileiros, em vez de promoverem o desenvolvimento humano, pareciam empenhados em criar um tipo de cidadão ideal: o miserável funcional. Aquele que não reclama, não exige, não questiona — apenas sobrevive. De políticas públicas que prometem inclusão a programas sociais que criam dependência crônica, o Estado brasileiro se especializou em distribuir migalhas e chamar isso de justiça social.

Educação: a arte de formar ignorantes úteis

Em vez de uma educação que emancipa, o Brasil aposta num sistema que reproduz desigualdade e emburrece com eficiência estatal. Escolas sem estrutura, professores desvalorizados, currículos esvaziados de pensamento crítico. O objetivo parece claro: formar uma população que saiba obedecer, preencher formulários, votar e... só.

Pensar demais virou ameaça. Questionar é rebeldia. Por isso, a escola pública é mantida em coma induzido. Afinal, povo educado é povo perigoso.

Assistencialismo como cabresto moderno

Programas de transferência de renda são necessários? Sim. Mas quando eles se tornam a única política social de longo prazo, viram ferramenta de controle. Pão hoje, miséria amanhã. E o ciclo continua.

O Brasil virou mestre em trocar cidadania por cesta básica. Não se cria autonomia, se gera dependência. E o pior: com direito a marketing político em cima da miséria alheia.

Saúde: o mínimo possível para manter vivos

O SUS é um gigante — e mesmo assim, vive sob asfixia. Hospitais sucateados, filas desumanas, falta de médicos, de insumos, de respeito. A saúde pública brasileira, muitas vezes, não cura: apenas prolonga o sofrimento em ritmo estatal.

Manter o pobre doente, cansado e desesperançado é parte do projeto. Um corpo sem força não protesta. Um povo doente não marcha.

Moradia e transporte: confinamento moderno

Nas grandes cidades, a moradia popular virou sinônimo de exílio urbano. Conjuntos habitacionais jogados nos confins da civilização, sem saneamento, sem escola, sem dignidade. Transporte? Lotado, precário, caro. O trabalhador pobre gasta 4 horas por dia apenas para sobreviver.

O recado é claro: “Fique onde está, aceite sua condição, agradeça por ainda respirar”.

Cultura e comunicação: silenciar ou cooptar

A cultura popular é marginalizada. O conhecimento livre é sufocado. O debate crítico é desestimulado — ou comprado. O Estado brasileiro prefere o funk que emburrece ao rap que questiona. Prefere o culto ao consumo ao pensamento libertador.

Conclusão: o miserável como projeto de governo

A miséria não é apenas um acidente histórico — é um instrumento político eficiente. Um país onde a pobreza é útil para os que comandam. Onde políticas públicas, em vez de libertar, aprisionam. Onde a dignidade é negociada em ano eleitoral.

O Brasil não falhou em erradicar a miséria.
Ele a transformou em base de governabilidade.

sábado, 26 de julho de 2025

Terras Raras: o poder escondido nos bastidores do século 21

Você já ouviu falar em "terras raras"? Pois é, parece nome de vinícola de luxo ou algum novo país recém-descoberto pela ONU. Mas na verdade, trata-se de um dos assuntos mais estratégicos do planeta — e que define, silenciosamente, quem comanda a tecnologia e quem apenas aperta os botões.

O que são, afinal, essas terras tão "raras"?

"Terras raras" é o nome dado a um grupo de 17 elementos químicos fundamentais para o funcionamento de quase tudo que usamos hoje: celulares, carros elétricos, turbinas eólicas, notebooks, fones de ouvido, mísseis inteligentes, painéis solares, drones e até satélites.

Os nomes? Uma mistura de feitiço de Harry Potter com aula de química: neodímio, lantânio, cério, praseodímio, túlio… Todos extraídos de minérios pouco glamourosos, mas de valor incalculável.

E por que são tão importantes?

Porque têm propriedades magnéticas, elétricas e ópticas únicas, que os tornam essenciais para miniaturizar e potencializar tecnologias modernas. O que o lítio é para baterias, as terras raras são para o resto do hardware inteligente.

Onde estão essas reservas?

Apesar do nome, essas terras não são "raras" no sentido geológico. Estão espalhadas pelo mundo, inclusive no Brasil. O problema é que sua extração e processamento são complexos, caros e ambientalmente desafiadores.

Atualmente, a maior parte da produção vem de:

China (a gigante do setor, com mais de 80% da oferta global)

Austrália

Rússia

Brasil

Estados Unidos

Groenlândia e Suécia (em ascensão)

 

O mapa abaixo mostra onde estão as principais reservas conhecidas:



A nova arma geopolítica

Quem controla as terras raras, controla o futuro energético e tecnológico do planeta. E a China sabe disso. Em tempos de tensões com o Ocidente, Pequim já ameaçou restringir a exportação desses elementos — o que deixou a Europa e os EUA em pânico.

Estamos falando de um novo tipo de guerra fria: não mais por petróleo, mas por elementos minúsculos que moram dentro do seu smartphone.

E o Brasil?

Surpresa: o Brasil está bem posicionado. Temos reservas expressivas, especialmente em Minas Gerais, Amazonas e Goiás. Mas, como de costume, exportamos matéria-prima bruta e compramos a tecnologia processada com o dobro do valor.

Sem investimento sério em pesquisa, refino e cadeia produtiva, corremos o risco de repetir a velha história: sentados sobre riquezas, mas pedindo licença para usá-las.

Conclusão

As terras raras são o petróleo do século 21. Elas abastecem não só máquinas, mas também ambições geopolíticas, estratégias de segurança e a promessa de um mundo mais limpo — ou pelo menos mais digital.

E aí, vamos apenas assistir mais esse trem passar, ou será que o Brasil vai acordar antes que a próxima tecnologia já nos coloque de novo na fila do subdesenvolvimento?

terça-feira, 22 de julho de 2025

A Moeda do BRICS: Um Novo Dinheiro Para o Mundo... Que Mal Paga Suas Próprias Contas.

 


Introdução
Imagine um grupo de países que mal consegue se entender numa videoconferência, tentando criar uma moeda para desafiar o dólar americano no cenário global. Parece roteiro de comédia? Pois é exatamente o que está sendo cogitado pelos líderes do BRICS — Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — com direito a novas adesões e discursos pomposos sobre multipolaridade, soberania e "um novo paradigma econômico".
Mas antes que você troque seus dólares por briccoins, vale dar uma boa gargalhada — e depois uma respirada profunda.

O BRICS vai salvar o mundo (de si mesmo?)
A proposta é ousada: criar uma moeda única ou lastreada em commodities, capaz de ser usada em transações internacionais e desafiar a hegemonia do dólar. Uma alternativa "desdolarizada", segundo os gênios por trás da ideia. Agora pergunto: você confiaria numa moeda gerenciada por um clube onde um dos membros está em guerra, outro em crise cambial, outro afundado em burocracia, outro em desacordo constante com o Ocidente, e outro tentando decidir se ainda é uma democracia funcional?

Confiança, essa desconhecida
A força de uma moeda global não está em discursos inflamados, mas em uma palavrinha chamada confiança. O dólar, com todos os seus defeitos, é hoje a referência porque há décadas os mercados confiam — ou fingem confiar — na economia dos EUA.
Já imaginar uma moeda gerida por um consórcio onde cada país tem sua própria crise para administrar é como esperar que uma banda de músicos desafinados compita com uma orquestra sinfônica. Pode ser barulhento, mas não é música.

Brasil: Vai pagar como? Com brics?
No caso do Brasil, que mal dá conta de manter sua moeda estável sem puxadinhos cambiais, o entusiasmo com a nova moeda soa quase fofo. Estamos falando de um país onde a política econômica muda a cada eleição, onde o Banco Central é atacado em rede nacional e onde o investidor estrangeiro olha para o real com a mesma segurança que teria ao pisar num pântano.
Mas sim, claro, vamos liderar uma nova moeda global. A piada se escreve sozinha.

E o PIX, fica como?
Tem algo deliciosamente contraditório em ver países tentando lançar uma moeda internacional enquanto internamente ainda sofrem com sistemas de arrecadação ineficientes, evasão fiscal monumental e um abismo entre o mundo político e a realidade do cidadão.
A nova moeda do BRICS seria digital, física, mágica? Seria aceita na padaria? Teria taxa Selic própria ou dependeria da cotação do arroz indiano e do petróleo russo?

Geopolítica gourmet
No fundo, essa moeda não é sobre economia. É sobre geopolítica performática. É sobre presidentes tirando foto com cara séria e jornalistas repetindo "multipolaridade" como se fosse o novo "namastê". É sobre marcar posição contra o imperialismo yankee, mesmo que seja com dinheiro que ninguém quer trocar.

Conclusão: O mundo quer confiança, não slogans
Se o BRICS realmente quer entrar no jogo monetário internacional, vai precisar mais do que discursos ideológicos e reuniões cheias de bandeirinhas. Vai precisar de estabilidade institucional, previsibilidade jurídica, respeito ao investidor e, acima de tudo, consistência.
Por enquanto, a ideia de uma moeda global do BRICS parece mais um jogo de tabuleiro jogado por líderes entediados do que uma solução real para a economia global. Mas agradecemos o entretenimento.

domingo, 20 de julho de 2025

Deborah Secco e o culto ao ego: por que a família virou alvo?

“Família margarina” está falida? Ou é o senso de responsabilidade que está fora de moda?

A atriz Deborah Secco, sempre muito confortável em polêmicas que geram manchetes fáceis, resolveu dar seu parecer sobre um dos pilares mais caros à sociedade: a estrutura familiar. Segundo ela, o modelo da chamada “família margarina” — aquele ideal de pai, mãe, filhos e afeto no café da manhã — está “ficando falido”.

Mas será que o modelo está falido... ou é o comprometimento com algo maior do que o próprio umbigo que se tornou insustentável?

Em tempos onde o ego reina, onde os likes valem mais do que laços, e onde a liberdade pessoal é confundida com irresponsabilidade emocional, não é surpresa que esse discurso encontre aplausos em certos círculos. Afinal, é muito mais fácil jogar a culpa no "modelo antiquado de família" do que encarar os próprios traumas, escolhas e falta de consistência.

A falência está na vitrine ou no conteúdo?

Vamos ser francos: a tal “família margarina” nunca existiu da forma idealizada. Ela sempre foi uma metáfora midiática, um símbolo publicitário de estabilidade e aconchego. Mas ainda assim, representava algo: um esforço conjunto. Um projeto a dois (ou mais) que envolvia sacrifícios, pactos, renúncias e sim, muito trabalho emocional.

Hoje, ao menor sinal de atrito, o discurso é “me amo e me basto”. A coletividade virou prisão. A parceria virou opressão. E o amor, aquele que exige maturidade, virou vilão do “livre arbítrio afetivo”. O problema nunca foi o modelo. O problema é que ninguém mais quer pagar o preço de sustentar vínculos reais.

Liberdade ou fuga disfarçada de modernidade?

Deborah Secco, que já declarou que "não nasceu pra ser de um homem só", agora assume o papel de pensadora social e decreta a falência de um modelo familiar. Mas que tipo de família ela defende? Aquela onde os vínculos são líquidos, o afeto é instável, e o compromisso é descartável como story de 24 horas?

Sim, o mundo mudou. Sim, há outros modelos possíveis de família — monoparentais, homoafetivos, famílias estendidas, mosaicos. E ainda bem. O que não dá é fingir que a falência da “família tradicional” se deve à sua rigidez, quando a verdade é que muitas pessoas preferem o hedonismo inconsequente à construção sólida.

O preço da tal “falência”

A tal “família margarina” pode não ser perfeita, mas pelo menos sustentava algumas ideias que hoje estão em extinção: estabilidade para as crianças, senso de responsabilidade afetiva, planejamento conjunto. Ao contrário do que se prega, liberdade sem responsabilidade não é evolução — é regressão emocional.

Quando uma figura pública como Deborah Secco rotula um ideal como "falido", ela não apenas dá sua opinião — ela alimenta um discurso de desapego emocional que veste a roupa de modernidade, mas que, na prática, desagua em solidão, relações descartáveis e uma geração inteira com medo de se doar.


Talvez a família margarina esteja derretendo, sim. Mas não por ser obsoleta. E sim porque a chama do egoísmo moderno está cada vez mais alta.

sábado, 19 de julho de 2025

Horse a Friend Waiting

Uma noite dessas, estive em mundos que não eram meus

Uma noite dessas, o sono não veio como de costume. Ele chegou diferente — arrastando correntes douradas e sussurrando palavras em línguas que minha mente desperta não compreende. Eu fechei os olhos, como quem apenas deseja descansar, mas despertei em outro lugar.

Não sei dizer se era um sonho, uma travessia ou um chamado. Só sei que, quando abri os olhos lá, o céu era roxo, pontilhado de luas dançantes, e o chão parecia pulsar, como se a terra tivesse um coração. Eu estava descalço, vestido com roupas que não eram minhas, e em volta de mim, criaturas feitas de vento sussurravam segredos que eu não tinha permissão para lembrar ao acordar.

Caminhei. Era tudo que podia fazer. A gravidade parecia funcionar por vontade própria, e cada passo me levava para uma realidade diferente.

Em um dos mundos, o tempo andava para trás. As pessoas nasciam velhas e iam ficando jovens até desaparecerem no ventre de suas mães. Vi uma mulher me cumprimentar com lágrimas nos olhos — ela jurava que me conhecia, e que eu já tinha salvado a vida dela ali, num tempo que ainda não tinha acontecido. Senti culpa por algo que ainda faria. Ou talvez já tivesse feito.

No segundo mundo, todos usavam máscaras. Não por medo, mas por excesso de sentimentos. Lá, as emoções eram visíveis como fumaça — quem amava demais, explodia em chamas. Quem odiava, congelava as plantas ao redor. Vi uma criança tirar a própria máscara só para sorrir pra mim... e em segundos, desapareceu como poeira de estrela.

No terceiro, não havia som — mas os pensamentos se materializavam no ar como pequenos insetos luminosos. Era impossível mentir ali. E talvez por isso, fosse também impossível ficar. As pessoas viviam isoladas, cercadas de suas próprias verdades dançantes, incapazes de suportar o peso de serem completamente vistas.

Passei por muitos outros lugares. Um onde a chuva cantava nomes. Outro onde os mortos dormiam em bibliotecas, esperando que alguém lesse suas histórias para acordá-los. Em todos eles, fui hóspede. Nunca anfitrião.

Até que, de repente, tudo escureceu. Ouvi uma voz suave dizer: “Já viu o suficiente. Agora é hora de lembrar quem você é.”

E acordei.

O quarto era o mesmo de sempre. As paredes, a janela, o barulho do mundo real tentando se impor. Mas eu sabia que algo em mim havia mudado. Na palma da mão, encontrei um pequeno grão de areia que brilhava — embora meu quarto estivesse trancado e limpo. Guardei aquilo em silêncio. Quem acreditaria?

Desde então, ando com uma desconfiança calma de que a realidade é só a superfície de um mar mais fundo. E que, às vezes, numa noite dessas, podemos escorregar por entre os véus do possível e visitar mundos que não são nossos — mas que, de algum jeito, nos pertencem.

segunda-feira, 14 de julho de 2025

Os Empurradores de Cadeiras do STF: A Corte Suprema da Pompa


Na mais alta instância do Judiciário brasileiro, onde se decide o destino de leis, liberdades e vidas, há uma cena que se repete com tranquilidade coreografada: ministros entrando no plenário, togados e solenes, enquanto assistentes cuidadosamente puxam as cadeiras para que eles possam se sentar com dignidade imperial.

Esses funcionários são conhecidos como “capinhas”, e sua função é tão simbólica quanto literal: empurrar cadeiras, vestir togas, servir café e acompanhar os ministros até suas poltronas de couro amarelo. Em pleno século XXI, no coração de uma República democrática, seguimos com rituais dignos de um tribunal absolutista.

A elite das cadeiras puxadas

Cada ministro do Supremo Tribunal Federal conta com ao menos um capinha exclusivo, somando onze funcionários dedicados exclusivamente a essa função cerimonial. Eles não são estagiários nem voluntários: são contratados, muitos via empresas terceirizadas, com salários que giram em torno de R$ 6.400 mensais.

Em um país onde o salário mínimo é de R$ 1.525,00, há quem ganhe quase cinco vezes isso para puxar uma cadeira e estender um tecido preto sobre os ombros de um magistrado.

Alguns ministros, como Luiz Fux e Alexandre de Moraes, preferem dispensar o ritual e puxar suas próprias cadeiras — um gesto mínimo de autonomia, mas que, nesse contexto, beira o revolucionário.

Pompa, símbolo e poder

A presença dos capinhas é defendida como parte da "liturgia do cargo", uma formalidade que reforçaria o prestígio e a solenidade da Corte. Mas a realidade nua e crua é que o gesto soa mais como caricatura do que como reverência.

Enquanto o cidadão comum enfrenta filas no SUS, processos judiciais que levam anos para se resolver e salários achatados, o STF desfila seus rituais de pompa como se estivesse blindado da realidade nacional.

Essa teatralidade não é apenas simbólica — é um reflexo de uma estrutura de poder desconectada da sociedade, onde o acesso ao Judiciário é cada vez mais limitado ao cidadão comum, e cada vez mais protegido para aqueles que o comandam.

Um Judiciário a serviço de quem?

Essa discussão não é sobre um simples gesto de cortesia. É sobre os privilégios de uma elite togada que se permite o luxo de viver cercada de protocolos que não servem à justiça, mas ao ego. É sobre a cultura da blindagem institucional, onde quem deveria dar exemplo de modéstia e serviço público vive cercado de símbolos de distinção aristocrática.

Estamos falando de uma Corte onde há auxílio-moradia, auxílio-livro, auxílio-educação, motoristas, seguranças e diárias generosas para qualquer deslocamento. E, no meio disso tudo, alguém pago para puxar a cadeira.

Hora de puxar o debate

É tempo de repensar as estruturas do Judiciário brasileiro — sua composição, seus ritos e seus privilégios. A toga deveria representar autoridade, não vaidade. O plenário, um espaço de serviço à nação, não um palco de encenações aristocráticas.

Porque, no final das contas, o que deveria pesar mais: o peso da cadeira… ou o peso da responsabilidade?

Togas de Ouro: O silêncio cúmplice diante dos privilégios do Judiciário.


Nos últimos anos, uma figura tem se repetido com frequência no discurso público brasileiro: o tal "homem de bem". Esse personagem moralista, defensor da ordem e da "família tradicional", costuma aparecer sempre que há alguma crise ética ou política — geralmente apontando o dedo para os outros. Mas há um território onde o silêncio do "homem de bem" é ensurdecedor: os super salários do Judiciário brasileiro.

O silêncio seletivo da moralidade

Quando se fala em combater privilégios, cortar gastos públicos e punir a corrupção, o discurso é certeiro — desde que os alvos sejam políticos, servidores do baixo escalão ou programas sociais. Mas e quando o privilégio mora no alto da pirâmide do poder, vestido de toga?

Pouco se discute sobre como juízes, desembargadores e ministros do Judiciário acumulam salários e benefícios que ultrapassam o teto constitucional. Gratificações, auxílios-moradia, auxílio-livro, auxílio-educação, retroativos, licenças-prêmio vendidas... tudo somado, não é raro encontrar vencimentos que ultrapassam os R$ 300 mil mensais.

Mas quem se atreve a apontar isso é acusado de "atacar as instituições". Ora, que instituições frágeis são essas, que não aguentam ser questionadas? E que moral é essa que só vale para os outros?

A justiça mais cara do mundo

De acordo com dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o Brasil tem uma das justiças mais caras do planeta. Em 2023, o gasto total com o Judiciário brasileiro ultrapassou R$ 120 bilhões. Isso mesmo: bilhões.

Apesar de toda essa despesa, a morosidade ainda reina. Processos que duram décadas, decisões que favorecem os poderosos, e uma seletividade na aplicação da lei que beira o cinismo. Para os ricos, habeas corpus. Para os pobres, cadeia.

A casta intocável

Enquanto professores lutam por reajustes, enfermeiros enfrentam jornadas exaustivas e servidores públicos veem seus salários congelados, juízes gozam de aumentos silenciosos e benesses garantidas por dentro do próprio sistema. E quando são julgados — em raros casos — são julgados pelos seus pares. Não é justiça, é uma confraria.

Onde está o "homem de bem" para criticar isso? Onde estão os indignados de WhatsApp e das redes sociais, os patriotas de bandeira na sacada, os moralistas de plantão? Quando o privilégio tem gravata e caneta de ouro, a indignação tira férias.

O problema não é o juiz — é o sistema intocável

É importante dizer: não se trata de atacar o juiz como indivíduo, mas de questionar um sistema que criou uma casta acima da lei. Não há democracia plena onde há desigualdade tão escancarada entre quem julga e quem é julgado.

A verdadeira moralidade começa onde dói: confrontando privilégios reais. E talvez seja hora do "homem de bem" olhar no espelho e se perguntar se ele está mesmo do lado da justiça — ou apenas do lado de quem nunca será julgado.

domingo, 13 de julho de 2025

"Quando a diplomacia late: Janja, os ‘vira-latas’ e a falta de freio no palco internacional"


Introdução

Quando a primeira-dama Janja soltou, em voz alta, o famoso “Ai, esses vira-latas”, parecia estar prestes a roubar a cena. O problema é que a ironia virou constrangimento diplomático — e ninguém riu.

1. O episódio

Em 9 de julho de 2025, durante um evento no Itamaraty, jornalistas questionaram o presidente Lula sobre possíveis novas tarifas dos EUA. No exato momento, Janja, visivelmente irritada, comentou: “Ai, esses vira-latas”, se virou e quase saiu andando. O gesto foi captado por câmeras — nem precisou legenda.

2. A justificativa: “não era por vocês, era por eles”

A assessoria correu para explicar: “o termo ‘vira-latas’ não se referia aos jornalistas, mas sim aos bolsonaristas traidores da nação”. Estranho: no teatro do Ministério das Relações Exteriores, quase não havia bolsonaristas por perto.

3. O peso de “viralatas”: ironia com passado cultural

Chamar alguém de “vira-lata” no Brasil não é só chamar de subalterno — é evocar nosso infame complexo de vira-lata, termo cunhado por Nelson Rodrigues em 1950, que expressa uma síndrome nacional de inferioridade perante o mundo. Então, quando Janja recorreu ao termo, despertou eco de frustração coletiva, não de dignidade patriótica.

4. A diplomacia ruidosa: cortejo sem etiqueta

Estamos lidando com a principal figura feminina do País, em alto palco diplomático – com o presidente da Indonésia e em clima delicado por tarifas. Irônico, pois a primeira-dama, personificação do “elegante soft power”, entregou um sopro de chule diplomático sem filtro. E no replay, a justificativa soou mais barata que pipoca murcha.

5. A guinada autocomplacente

Pior: parlamentares da oposição não perderam tempo. O deputado Zucco (PL-RS) chamou de “despreparo e arrogância” de alguém que “se comporta como chefe de Estado” sem um voto. Janja nos dá comédia barata quando se oferece para “ressignificar” a função — mas muitas vezes só amplia o palco para suas gafes.

6. O tiro no pé: oposição feliz, aliados em alerta

Curiosamente, seus aliados no PT até usaram o episódio para reforçar críticas à oposição “vira-lata” — mas essa tentativa de martelar discurso virou um martelo que bateu no próprio. Depois da piada, o silêncio foi um poço mais alto que o discurso.

Conclusão

Querida Janja, se o objetivo era criticar a “entrega” nacional ao inimigo econômico — parabéns: foi eficaz. Mas chamar de “vira-lata” num evento internacional era tão sutil quanto um rojão estourando na calçada. O tiro saiu pela culatra: virou meme, manchete, e ainda inflou polêmica interna.

Acabamos ficando com a pujança da diplomacia derrubada por uma frase de efeito sem elegância — e sem consequência controlada. Às vezes, a diplomacia exige menos fogo de palha e mais moderação estratégica.

Chamada final: Se a ideia era “lacrar contra traidores”, acabou “lacrando contra si mesma”. Porque num palco internacional, quem fala “viralatas” corre o risco de virar piada global.