terça-feira, 23 de abril de 2024

O GAÚCHO QUE LAÇOU UM AVIÃO

Numa tarde de janeiro de 1952, o jornalista Cláudio Candiota, então diretor de A Razão, de Santa Maria, encontrava-se em sua sala quando foi procurado pelo comandante do aeroclube da cidade, Fernando Pereiron. 

O visitante trazia uma notícia de impacto, mas não para ser divulgada. 

Pelo contrário, queria escondê-la. 

Temia causar prejuízo à imagem do estabelecimento sob sua responsabilidade. Quando soube do que se tratava, a reação de Candiota foi em sentido oposto: “Deixa comigo. 

Vou tornar este aeroclube famoso em todo o mundo. 

É a primeira vez que acontece uma coisa como essa”, disse de imediato. Como também era correspondente no Rio Grande do Sul de O Cruzeiro, o jornalista telefonou para a direção da revista, no Rio, que mandou, já no dia seguinte, para Santa Maria, o seu melhor fotógrafo, o gaúcho Ed Keffel.

 Uma semana depois aparecia, com exclusividade, a reportagem em cinco páginas, amplamente ilustrada. 

Um peão de estância tinha simplesmente laçado um avião em pleno vôo. 

E como houve dano na hélice do aparelho, o piloto estava ameaçado de demissão, por ter agido de forma imprudente e provocativa, e por não ter comunicado o fato às autoridades aeronáuticas. 

TIRANDO RASANTES O autor da façanha de “laçar um avião pelo focinho” foi o peão Euclides Guterres, 24 anos, solteiro, descrito na época como vivaz , fazedor e contador de proezas. 

Tudo começou quando o jovem piloto Irineu Noal, 20 anos, pegou o “Paulistinha” Manuel Ribas e decolou rumo à fazenda de Cacildo Pena Xavier, em Tronqueiras, nas proximidades da base aérea de Camobi, e passou a tirar repetidos rasantes sobre as coxilhas. 

No alto de uma delas, Euclides cuidava de uma novilha com bicheira e não gostou do que viu. 

Achando que aquilo era alguma provocação, não teve dúvidas: armou o laço de 13 braças e quatro tentos e atirou em direção ao bico do teco-teco, acertando o alvo. 

Por estar preso na cincha do arreio sobre o cavalo, o laço, com o impacto, arrebentou na presilha e seguiu pendurado no avião. 

O piloto, assustado, tratou de pousar. 

Ainda na cabeceira da pista, longe do hangar, retirou o laço e o escondeu no meio das macegas.

 "Eu não fiz por maldade. 

Foi pura brincadeira. Para falar a verdade, não acreditava que pudesse pegar o aviãozinho pelas guampas num tiro de laço.", disse o peão Euclides Guterres. 

"Nada nos pode parecer mais estranho do que a notícia de que um homem tenha laçado um avião. 

A vontade que a gente sente é mesmo de duvidar.

 Mas, a verdade é que a extraordinária façanha aconteceu no pampa gaúcho, em Tronqueiras, na rica fazenda de Arroio do Só, no município de Santa Maria." 


- Abertura da reportagem publicada por O Cruzeiro, em 23 de fevereiro de 1952, assinada por Cláudio Candiota 1952.